6 de outubro de 2008

Auto-estima

O assunto de hoje é auto-estima e vou ilustrar o meu ponto de vista com a parábola “Águia ou galinha?”. A história é assim:

"Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração própria para galinhas. Embora a águia fosse o rei / rainha de todos os pássaros.
Depois de cinco anos, este homem recebeu a visita de um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
– Este pássaro aí não é uma galinha. É uma águia.
– De fato, – disse o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase três metros de extensão.
– Não – retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.
– Não, não – insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:
– Já que de fato você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe!
A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas.
O camponês comentou:
– Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
– Não – tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia. E uma águia será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.



No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurou-lhe:
– Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!
Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas, ciscando o chão, pulou e foi para junto delas.
O camponês sorriu e voltou à carga:
– Eu lhe havia dito, ela virou galinha!
– Não – respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar.



No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha. O sol nascente dourava os picos das montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
– Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra as suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse nova vida. Mas não voou. Então o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.
Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou com o típico kau-kau das águias e ergueu-se soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a voar cada vez para mais alto. Voou... voou... “Até confundir-se com o azul do firmamento...”
(Parábola citada em livro de Leonardo Boff)
Nessa estória acima, nós vimos que um camponês capturou a águia, colocou-a num galinheiro e ela aprendeu a agir como galinha, mesmo sendo o rei/rainha de todos os pássaros. Fazendo uma analogia para o ser humano, pode-se afirmar que todas as pessoas nascem para serem águias, isto é, reis e rainhas de suas próprias vidas. Mas, há alguns fatores externos ao indivíduo, que acontecem principalmente durante a infância (quando se forma a auto-imagem), que levam a águia de cada pessoa a agir como uma galinha. Eu vou comentar alguns destes fatores:

1)O baixo poder aquisitivo da família – a privação material da família impossibilita a criança de satisfazer, em maior ou menor grau, suas necessidades básicas (vestir, alimentar, brincar, estudar) e pode provocar sentimentos negativos nela, como, por exemplos ,sentimento de menos valia, sensação de destino injusto, incerteza do presente e medo do futuro, etc.

2)Comportamento compensatório dos pais - Há pais que suprem a sua ausência de atenção e afeto aos filhos dando-lhes dinheiro e presentes. Estas crianças e adolescentes tendem a sentir que não são importantes o suficiente para que os seus pais os amem e acabam se tornando materialistas, pouco resistentes às frustrações, querendo ter sensação de poder e prazer imediato. O consumo vira vício e a felicidade é percebida como sendo algo que vem de fora da pessoa.

3)Super proteção dos pais -Quando os pais exageram nos cuidados, na preocupação e atenção e evitam, de todo modo, que os filhos sofram frustrações ou enfrentem problemas, os filhos acabam se tornando mimados, amedrontados, dependentes, inseguros e começam a acreditar que são incapazes de lidar sozinhos com as adversidades porque lhes falta confiança em si mesmo.

4)Autoritarismo dos pais – Pais excessivamente severos, que se consideram os “donos exclusivos da verdade”, que são muito críticos e não admitem qualquer tipo de erro, geram insegurança nos filhos, que reagem de forma tímida ou agressiva. Estes filhos crescem não se permitindo errar, tornando-se perfeccionistas. Costumam magoarem-se facilmente quando são criticados, sentem dificuldades em receber elogios e estão sempre se comparando com as outras pessoas.

5)Rejeição pela família e amigos - A criança rejeitada tende a se tornar um adulto que não se considera digno de receber afeto, amor.
• Muitos destes adultos, para corresponder ao afeto recebido, procuram sempre agradar, não negam nada e acabam ficando sobrecarregadas. Como têm dificuldades de assumir a responsabilidade sobre seus atos, culpam os outros pelos fracassos ocorridos e se fazem de vítima das circunstancias;
• Alguns evitam o medo de ser rejeitado fugindo do contato social.;
• Outros apresentam ciúme excessivo, possessividade e necessidade de controlar o amado, por medo de ser ignorado, abandonado;
• Há ainda aqueles que apresentam rebeldia, comportamentos anti-sociais como resposta à rejeição.

6)Perda ou separação de entes queridos – Estas situações costumam despertar sensações de vazio, medo, solidão. E este sentimento de desamparo, traz consigo ansiedade, angústia. Para diminuir esta tensão, busca-se o alívio através de:
• Fontes de prazer externas (comer, beber, jogar, trabalhar, etc.) - Alguns indivíduos acabam fazendo disto um hábito. Recorrem sempre ao prazer para sentir alívio da tensão provocada pelas situações estressantes da vida.
Uma parcela deste grupo, devido a outros fatores, torna este comportamento excessivo e freqüente, o que gera conseqüências negativas em sua vida, e o sentimento de culpa ou vergonha aparece após cada ato. Por exemplos: alguns compram ou jogam compulsivamente, sem levar em conta o valor do saldo bancário, acabam ficando endividados, perdem bens, daí sentem remorso, há um aumento de sua angústia e eles buscam nas compras ou nos jogos o alívio da tensão. Está formado o círculo vicioso. O mesmo acontece com quem come impulsivamente, mesmo sem fome: engorda, fica obeso, sente-se feio ou rejeitado, se deprime e busca na comida o bem-estar. Esquema semelhante acontece com quem faz uso abusivo de fumo, bebidas ou drogas, quem se torna workaholic, etc. A pessoa já não sente mais prazer naquela atividade, ela só a busca para evitar a angústia, a ansiedade, à depressão que as conseqüências negativas produziram.
• Inclinação para a fantasia – O individuo vive de ilusões, alimenta sonhos inatingíveis, cria altas expectativas, constrói fantasias para não entrar em contato com a sua própria realidade. Espera encontrar o príncipe ou a princesa encantada que lhe fará feliz para sempre. Mantêm relacionamento de dependência emocional pois acredita que é a outra pessoa que vai transformar a sua vida e lhe dar felicidade.

7)Traumas por Violência física – A violência física costuma deixar seqüelas psicológicas como, por exemplos: dificuldade de se relacionar com outras pessoas, agressividade, instabilidade emocional, dificuldades de aprendizagem, sentimento de culpa ou vergonha, entre tantos outros.

8)Conflitos entre irmãos – Quando os pais demonstram preferência pelo filho do sexo masculino em detrimento ao feminino (ou vice-versa), quando freqüentemente compara-os, quando são muito exigentes com um e condescendente com o outro, acabam estimulando a rivalidade entre seus filhos. Esta disputa provoca o ciúme, a inveja e hostilidade entre os irmãos. Quando a estes comportamentos não se intercalam momentos de fraternidade e solidariedade, a relação familiar torna-se fonte de sofrimento e os filhos que se sentem privados de atenção e afeto podem expressar comportamentos que variam desde a auto-depreciação até a onipotência.

9)Doenças - quando a pessoa tem uma doença que a deforma ou a torne deficiente ou que a prive do contato social, isto repercute no seu estado emocional podendo gerar sentimentos como raiva, culpa, medo, inferioridade, incapacidade, depressão, falta de confiança em si mesma.

Assim, a 'águia' passa a agir como ‘galinha’, isto é, a pessoa torna-se um adulto que não se valoriza, que não acredita na sua própria capacidade de realização, que não confia em si mesmo, que coloca a sua felicidade como algo que vem de fora dela.

A águia da história foi colocada, duas vezes, para voar, pelo naturalista. Mas, ela via as outras galinhas ciscando, e voltava para junto delas. O mesmo acontece com a pessoa que tem baixa-estima. Ela tem dificuldades para tomar decisões importantes sozinha, tem medo de correr riscos. Está sempre preocupada com a opinião alheia, precisa de aprovação e reconhecimento e, para agradar aos outros, abre mão dos próprios princípios. Quer se sentir importante para os outros, porque, na realidade, ela não se sente importante nem para si mesma. Aceita ‘migalhas’ de amor porque esta é a intensidade do amor que tem por si própria. Mas, mudar esta situação é possível. Luiz Alberto Py, médico psiquiatria e psicanalista, afirma que: Nessa parábola, quando a águia é levada para longe das galinhas, ela é estimulada a ser e agir como águia. Inicialmente, ela mostra medo porque tem que enfrentar a situação confiando em si mesma. Mas, o naturalista a incentiva a encontrar as suas próprias forças, a assumir o seu eu, a acreditar em suas próprias capacidades. E ela se supera: grasna e voa, cada vez mais alto. O mesmo acontece com quem se decide a se amar, a se respeitar. Quem assume uma postura de auto-aceitação, começa a mudar a sua maneira de se tratar:
"O processo de recuperação da auto-estima consiste em desmentir os valores equivocados que nos foram ensinados e que estabelecem o sucesso como condição para gostarmos de nós mesmos. Somente com esforço e atenção é que seremos capazes de, com o tempo, reavermos a possibilidade de nos querermos bem independentemente de quem somos".
• Evita comparar-se com outras pessoas pois sabe que cada indivíduo é um ser único e que ninguém é melhor do que ninguém.
• Enfrenta o medo pois sabe que ele é o sinal amarelo e não o vermelho. Ele é só um aviso dizendo para ter atenção e pensar melhor antes de agir.
• Ouve as críticas negativas com naturalidade porque sabe que os erros servem para mostrar que o caminho escolhido não é o melhor e que há outras opções. E muda o que deseja.
• Se aceita com o corpo que tem. E cuida dele com carinho, zelando pela sua saúde e pela sua beleza. Ama-se do jeito que é, com a fisionomia que tem. Aprende a sorrir para si mesmo todas as manhãs e agradecer a Deus pelo dom da Vida.
• Reconhece seu valor, suas qualidades, seus conhecimentos, suas habilidades. Compreende suas fraquezas e procura ser bondoso consigo mesmo.
• Respeita os próprios sentimentos e emoções. E compartilha com o outro o que há de melhor em si.
• Engaja-se em atividades onde possa se divertir, fazer amigos, ter relacionamentos saudáveis.
• Trabalha com planejamento, estipulando metas a curto, médio e longos prazos, conforme seu ritmo e capacidade de realização.
• Aprende a perdoar a si mesmo e aos outros. Evita ressentimentos e não fica presa a faltas do passado porque sabe que a felicidade que vai colher no futuro é construída com a semente que for plantada hoje.

(Autoria: Marta Betania - 6/10/2008)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Gostou? deixe aqui o seu comentário.